quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

pelos cantos do sol tenho a certeza do traço de luz no teu rosto
quebrando a rotação da terra

bebo-te pelas palavras e as consoantes

distantes do mundo maravilhado de luas floridas
árvores de contas no cantinho do jardim dos verbos por começar
onde meninos de sorrisos à espreita fazem novas conjunções
supostas promessas ao deus do sol
para que o inverno cruel não nos adoeça os ossos do coração
e nos plante veias de coragem nas cearas dos olhos
certezas evidentes do apressado sangue a pulsar-nos a respiração
segredos desnudos de mais um dia.

Zé Afonso

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Se pudesse seria um pássaro a rondar campos de feno com cheiro de outono à porta revestido de folhas ultra coloridas a denunciarem mais uma passagem no calendário do tempo dos homens desavisados de relógio, mas com os sentidos na boca da alma.

Se pudesse seria apenas o vento nas eiras a espreitar segredos e a deixar rastros de sol nas mãos daqueles que nos querem bem e dos outros também.

Se pudesse seria os derradeiros tons de verão, ora quentes ora amenos que nos acenam com os olhos como se quisessem dizer adeus.

Se pudesse seria uma mera gota no deserto das palavras infindáveis que nos fertilizam a imaginação e que languidamente nos empurram para mais uma estação onde árvores despidas nos abraçam em silêncio.

Zé Afonso

terça-feira, 30 de agosto de 2011

iluminada junção de incríveis momentos que nos ruborizam a face no perpétuo movimento da bailarina das flores perante o estonteante sol de agosto que nos fustiga a pele em suspiros desconcertantes como voos invisíveis no inviolável tempero dos segundos a pular ondas com delicados contornos corporais, risos atordoados de um alegre palhaço em telas coloridas de incógnitas palavras de silêncio, ora gritantes ora melancólicas e vagarosas como grãos de areia cobertos pela espuma do mar no palco dos instantes pintados de conteúdo essência de tudo aquilo que nos faz bem e nos alegra como sopros de gargalhadas colhidas antes do amanhecer de mais um dia.

Zé Afonso

quarta-feira, 29 de junho de 2011

flores de verão no soslaio das manhãs desertas de junho
oceano hipnose de liberdade na direcção azul do céu

adivinho a dentada nas palavras como dedos a partilhar a morna pele

inconscientemente corro os olhos pelos socalcos do caminho
rumo ao sol que me trucida com sensações preenchidas de toques e tonteantes palpitares no canino cio cheiro de terra quente enfeitada de odores
desalinhados deleites deste ponto cardeal desmaiado de tempo como navalhas no sentido torto das palavras


agora que o verão quase me destapa os sentidos da vida relembro curiosamente os teus pés descalços na minha secreta caixinha de música
sei de antemão que me pertences com feitiços repletos de cerejas na gaiola dos dias desamparados de rosa dos ventos
Norte Sul Este Oeste para contemplar o sol de frente pra vida e com punhados de esperança nas algibeiras da alma

armadilhas de cegos segredos nos braços de mais um dia
certezas concretas de olhares fugazes na varanda colorida de sentidos
baloiço de penas rumo ao céu onde gaivotas felizes nos dão acenos alaranjados e beijos de sol
alegrias bem vindas e histórias para dormir ao sabor do mar
em noites claras de fogos de artificio

Zé Afonso

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Se me tocas as pálpebras eu escondo me em bolsos alheios de conchas do mar ou na cama que fizemos entre os sonhos nas monções das macias palavras que se apegam à alma como lesmas delirantes à procura de açúcar.

Se me tocas as pálpebras, devidamente castigadas de cansaço, eu escondo me a decifrar segredos escondidos nos castos nós dos dedos enquanto adivinho confidências na lua com acenos de trapezista tatuados nas inquietantes gargalhadas ocres das flores ou nas profundezas do gesto que teimo em perseguir no torpor das noites oleadas de perdição.

Se me tocas as pálpebras eu desfaço-me em chuva de alegrias e em acelerados tic tacs do meu leviano relógio de pulso que descaradamente mostra me o descortinar insólito de mais um dia a descer dos céus como nuvens de açafrão.

Se me tocas as pálpebras? Juro, não resisto nisto que insisto!

Zé Afonso

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Sentidos de vozes espalhadas nas searas da pele que juro saber de cor. Pequenos infinitos que nos dão eternos significados. Singelos, mas verdadeiros beliscões nos seres desavisados e repletos de vontade. Palpitantes cantos aconchegos refúgios em tábuas rasas: identidades reflexos de cordões umbilicais, placentas transcendentes de calor.
O infinito espreita-me à esquina das palavras, na varanda do coração


o infinito aparece-me assim
sem tamanho
sem documento
sem aviso
sem bater à porta e também sem gritar da janela que as coisas da alma não se medem: cultivam-se.


Medidas exactas que querem SER
Ser para Sempre em sorrisos sinceros nas fruteiras dos dias colhidos ao acaso
múltiplas essências de vida
infinitos lugares sem razão, mas com sentidos desmesurados desta minha nossa imensa partilha de compartilhar instantes multiplicados ao expoente máximo de tantos poentes nascentes ora no mar ora no topo das montanhas, quiçá na lua
polposas certezas costuradas a saliva na sala dos espelhos, reflexos coloridos da alma
olhar de quem olha por nós e para nós com meigos gestos e delicadezas nos olhos
intimidades de retratos a preto e branco estendidos no chão
não sou dono das verdades absolutas, mas quero guardar a relevância superlativa deste momento e afirmar que o amor alimenta a alma e que para meio entendedor uma boa palavra basta: realmente é a caminhar que se constrói o caminho!


Zé Afonso

segunda-feira, 18 de abril de 2011



Os meus lábios habitam-te a pele

morada quente dos sentidos na poeira das horas sem cronologia
saliva de luz nas capas da epiderme entre as loucuras sensatas da primavera em flor
desfloradas margaridas embaladas pelo vento esquecido de outras estações
onde o sol matreiro repentinamente fez a sua casa e descansou
descansou profundamente como se nada mais houvesse no desconcerto da alma
além do azul do mar e do cheiro adocicado das montanhas coloridas
amparos discretos de corpos deitados na erva de orvalho perdidos entre olmos de risos e dedos nas pálpebras de vagos sonhos colados na pele

inquietantes instantes de afagos no coração

Zé Afonso

quarta-feira, 30 de março de 2011


assalto te a alma com mãos de aprendiz
onde te beijo os seios com os olhos enquanto o teu sorriso me desperta o sono e nos aglutina em momentos esquecidos nos ponteiros incertos do relógio
inicio dos tempos a colher olhares distraídos nos corpos suados de ponderados instantes nus onde te penetro com o cio ansioso das vontades
fúria cruel de tantas outras paragens na desordem das horas

ventres desvairados de encontro ao espelho

no planar bordado das aves pelo céu colorindo encantos cadentes perfumados
passos desgrenhados sobre a casa do teu corpo despido para lá do espanto
escancarada penumbra desalinhada dos lençóis a contemplar as tuas pernas de risos cativos
abrigo de nós na garganta abreviando silêncios
pedaços egoístas à medida dos sonhos misturados nos lábios subitamente exilados
na fuga das incontáveis noites de arrepios de hálitos quentes e cegos dentes na pele de aconchegos

expulsos de nós mesmos e perdidos nos odores assanhados das almofadas
onde juntos, em espanto, conhecemos o verdadeiro azul do mar

Zé Afonso

quinta-feira, 10 de março de 2011


Tangentes gemidos mudos no delírio profano das palavras
fragilidade de mãos em pétalas de chuva adornadas de sol
memória a mapear-me os olhos e a conduzir-me pelo braço,
algodão nos bolsos de silêncios à janela
cortinas de olhos costuradas de pequenas gentilezas fugazes
delírios de batimentos cardíacos na imensidão palpável das tuas complexas avenidas
estranhos encontros da alegria perante a extenuante velocidade da vida
folhas desdobram-se em acto de contrição com enfeites de flor nos girassóis dos imensos sorrisos
recíprocos momentos a sós onde (te) reinvento invento no irreparável mundo dos contrariados sentidos
consciente preambular entre as teias da verdade e a complacente virtude de olhar o mar com o coração nos olhos
um córrego apressado na opressão do meu pulsar e eu um anarquista do teu inebriante sorriso
E se te inventasse? E se nos inventasse (mos) aqui onde as mãos querem ser braços abraços
e os olhos delicadas flores para adornar te o cabelo com sopros de alma.

Zé Afonso

sábado, 12 de fevereiro de 2011

* "onde termino sempre num mar de gaivotas no teu peito"

Palpo esta doce realidade nos ponteiros do marcador do tempo - estações perfeitas que ilustram madrugadas de hálitos doces como bolos de arroz em mãos de menina, cópias insanas no olhar da alma, brasa que nos aquece este momento extasiado de luz luar. Labuta em nós de dedos nos seios dos sentidos, esconderijos distraídos nos faróis do caminho onde de mãos dadas chegamos ao sol e, de pé em pé pelas escorregadias pedras da praia alcanço horizontes azuis no desenho das tuas costas, alegria de giz a pintar docilidades no aconchego do teu colo de moinhos arrastados no movimento das marés.

Zé Afonso